Saber mais sobre a Vicki

 

A Verónica chegou e partiu no exacto mesmo dia, com 21 anos de diferença. 

 

Nasceu no dia 1 de Junho de 1977 e deixou-nos no 1 de Junho de 1998, vítima de um acidente de viação. Isso mesmo, nasceu e morreu no Dia Mundial da Criança. Estudava Educação de Infância no Instituto Politécnico de Leiria, no pólo das Caldas da Rainha, e ansiava pelo dia em que poderia trabalhar com crianças. Deixou-nos, sem nunca ter tido oportunidade para o fazer.

 

Foi uma criança muito alegre, muito brincalhona e de trato fácil, e que revelou, desde cedo, uma invulgar sensibilidade para apreender as singularidades da vida.

 

Escolheu com minúcia e amor aquela que viria a ser a chupeta da sua irmã, que lhe chegou aos quase 5 anos (4 anos e 10 meses, para ser mais precisa).

 

Chegada ao hospital, tratou de introduzir a chupeta-flor na boca da bolinha de carne que lhe calhou em sorte como mana. Para sua imediata e grande tristeza, a Bolinha de Carne cuspiu-a prontamente.

Dá-se o caso de a Bolinha de Carne nunca ter apreciado falsos mamilos de plástico de onde não sai coisa alguma, e só tolerar a permanência de chupetas na sua boca até ao exacto momento em que se acabava o mel com que a mãe de ambas as untava. Manias…

 

Diz quem viu, que a reacção de tristeza da Verónica à cuspidela da estimada chupeta em flor, comovia. Marota, a Bolinha de Carne.

 

Os dislates da Bolinha de Carne não se ficaram, contudo, por aí.

 

Tornou-se recorrente a Verónica ter uma potencial bailarina do Rancho Folclórico de Marmelete (que não existe, nem nunca existiu) em cima da mesa onde tentava fazer os trabalhos de casa. Às páginas tantas, a apetência natural da Bolinha de Carne para a dança tradicional foi prontamente erradicada com um açoite no traseiro e a indicação de que deixasse a mana estudar.

 

Destroçada, mas sem desarmar, a Bolinha de Carne mudou de estratégia.

 

Passou (literalmente) a comer as pontas das folhas dos livros da Verónica. Custasse o que custasse, a atenção da mana Verónica haveria de ser sua.

 

Marota, a Bolinha de Carne…

 

[ter-se-ão passado alguns anos até que a Verónica percebesse que aquilo que parecia um acto de pura maldade da Bolinha de Carne, mais não era do que o profundo amor e desejo de atenção da mana Caçula]

 

Manifestou-se, também desde cedo, o vincado interesse e desejo de contacto humano da pequena Verónica.

 

Era recorrente a mãe de ambas dirigir-se à casa da vizinha com quem a deixara e descobrir que já lá não estava, nem na casa a seguir por onde também já passara, mas sim, e invariavelmente, na última casa da rua. Não sem que antes tivesse já almoçado, pelo menos, 3 vezes (só petiscos ao agrado do fino dente, de resto) e amealhado sugus e sombrinhas de chocolate como se de um esquilo em estado de pré-hibernia se tratasse.

 

Cresceu feliz (à margem dos episódios chupetianos e folclóricos com que a mana sempre a brindou), espalhando indesmentível e contagiante alegria por onde passava.

 

A sua sede e necessidade de contacto humano tornaram-se alvo de constante reparo. Dizia o pai, que não havia cão vadio na região que não tivesse já trocado dois dedos de conversa com a Verónica.

 

Sair de casa para comprar aquele bem de primeira necessidade chamado “palitos”, outra manifestação daquilo que todos antecipamos.

 

Entrar nos afamados bailes da Casa de Povo de Marmelete, agarrar o primeiro sénior que lhe aparecesse à frente e deslizar por ali fora roubando para a sua cabeça o chapéu que este usava, outra marca muita característica da Verónica.

 

[em retrospectiva, a leveza e o à vontade com que vivia ganharam contornos de estranhos sinais de que saberia, quase intuitivamente, que não estaria por cá muito tempo, por isso, vamos lá aproveitar tudo, tudinho, como deve ser]

 

É-lhe reconhecida a arrepiante facilidade com que comunicava com a brigada das chupetas e doudous, brigada do reumáutico, pó da berma da estrada, e com os grilos que se libertaram da casinha de plástico e se espalharam por toda a casa (não me lembro de nada, mas parece que foram muitos dias de continua, ininterrupta e muito audível sinfonia…).

 

Acumulou amizades, sem exagero, por todo o lado por onde passou.

 

Volvidos tantos anos, ainda hoje aparecem, na sua última morada, jarrinhas de flores e florzinhas vindas sabe-se lá de onde. Dos corações onde parece ter-se instalado ad aeternum, talvez?

 

Às vezes, muitas vezes, a mana Caçula pergunta-se sobre os motivos que terão estado na origem desta prematura viagem da sua querida mana, para tão longe

 

Às vezes, muitas vezes, a mana Caçula conclui que deve ter havido uma qualquer necessidade de controlar uma epidemia de doces lá no Céu e que a incrível e reconhecida habilidade da Verónica para gerir stocks de sugus e sobrinhas de chocolate, fizeram dela a candidata natural ao cargo (parecendo que não, foram muitos anos a monopolizar o abarbatar de doces aos vizinhos da rua).

 

Acha também que, algures entre um pezinho de dança com um qualquer sénior, horas sem fim a pintar desenhos e as inevitáveis participações em campeonatos internuvem da corrida da estrela cadente, a Verónica é bem capaz de estar feliz, de estar muito feliz.

 

Ainda assim, a mana Caçula achou que mesmo tendo a Verónica saído de cena, haveria de continuar-lhe a vivência de episódios chupetianos e folclóricos. Nasce assim a Vicki.

 

Nasce assim, na verdade, a Creche (Universo) Azul-Bebé, povoada pela doçura, alegria (e travessuras!) da Vicki e de todos os seus amiguinhos.

 

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